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segunda-feira, 16 de setembro de 2024

A Pedra que Sonhava ser Lua© Copyright

 


Essa é uma história, mas não é uma história qualquer. É um daqueles contos que a gente encontra perdido no fundo do quintal, entre as folhas secas e os cacos de telha, sentado em uma cadeira quebrada. Uma história não se preocupa muito com começo, meio e fim, porque o que importa mesmo é o sentir, a preocupação de saber do espaço.

Havia um pedregulho que sonhava em ser lua. Não que ele fosse infeliz, mesmo sendo uma pedra. É que às vezes ele se pegava olhando para cima, pensando como seria flutuar no céu, fazendo companhia para as estrelas e para as pedras com caudas em movimento.

Numa dessas noites, um grilo, que não era desses de cantarolar serenatas, mas sim de gritar tilintando verdades, encontrou o pedregulho. A pergunta foi inevitável:

– O que você faz aí parado, pedregulho? – perguntou o grilo.

– Eu tô aqui sonhando em ser lua – respondeu o pedregulho, em alta voz silenciosa.

O grilo, que era muito sabido das coisas do chão, porém curioso sobre as coisas do alto, decidiu ajudar o pedregulho.

– Bom, eu não sei muito sobre ser lua, nem ser vaga-lume, mas sei que pra chegar lá em cima, a gente tem que ter leveza; música de plumas ou rendas de vento. Sobre leveza, experimentei apenas nos sonhos que flutuam e nas estrelas que parecem cintilar sentidos.

O grilo iniciou uma contação de histórias para o pedregulho. Histórias de vento, de rio que corre para abraçar e se misturar com o mar. Também contou sobre libélulas narcisistas, visitantes de águas paradas, a se espelhar, e de passarinhos que se despedem do ninho para aprender a arte de voar. Enquanto contava, o pedregulho ia sendo tomado de leveza, dessas que flutuam ferro em nuvens.

E foi assim que o pedregulho virou lua. Não virou uma lua de verdade, daquelas que a gente vê no céu. Virou uma lua de sonho, que só quem tem olhos para ver o invisível consegue enxergar.

E o grilo? Bom, o grilo continuou por aí, gritando suas verdades e ensinando. Afinal, era um chão duro que levava pedras a brincarem de ser pássaros e a sonharem com evolução.


Betonicou©

“Os mistérios da mente são tecidos pela sobrevivência dos sonhos na realidade. A pedra se levanta em lua, e eu, grilo, grito a seres que vagam em trilhas de lumes”.


Amigos, resolvi fazer algo diferente nesta postagem: um conto, no estilo fábula, que é muito do meu gosto. Espero que apreciem!

 

4 comentários:

  1. Meu amigo Adalberto,
    Somos todos pedras que querem passar por transformações nesta arqueologia incrível que é a vida. Sonhamos não em ter ouro, mas, em nos transformar em ouro. Somos espadas forjadas no fogo nesta alquimia que o tempo nos devolverá ao pó, na cadeia alimentar que nos fará ser engolidos pelo “cio da terra”.
    Um grande abraço alvinegro!!!

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  2. Sempre poeta, amigo Beto! Seja em verso ou prosa, a poesia brota de sua alma, como a água cristalina de uma fonte natural. Uma das páginas mais bonitas que li, nestes tempos mais recentes! Meu abraço, boa semana.

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  3. Saí como unknown? Faz parte. Voltei para dizer que esse conto está, realmente, perfeito! Abração.

    Flávio Cruz

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    1. Flavio, você apareceu como desconhecido, mas reconheço sua grande gentileza. Gratidão, amigo!

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