Ah, que saudade da
minha terra! Não essa
terra onde piso meus passos, mas a terra
onde caminho meus sonhos, onde voo meu
imaginário de pássaros. Sinto falta dos
versos leves, como
palmeiras à margem do
frescor dos riachos.
Saudade é minha sina,
pois sou feito de
barro, modelado em
tempos de laços.
Tenho em mim brisas,
filhas de vento forte,
sopros que moldam rostos. A saudade é
uma nau navegante, à
procura de um acaso
que a aporte. Seja num
mar de ondas
eriçadas ou amenas, ou gotas de chuva a
molhar enseadas. Passeio em devaneios,
pincéis de neurônios a
pensar e pincelar as
telas de minhas estradas espirituais e
gasosas.
Teimosas são as
passadas pelos canteiros
de espelhos e lembranças refletidas. Assim
são as causas das flores desfolhadas:
pétalas errantes,
passeantes divagantes,
sisal em linhas de
causas atadas. Ah, que
saudade dos ventos, por onde passeavam
leves as musas do
parnaso, em cavalos
alados, amigos dos ventos que, em
delicadezas, recebiam meu peso em versos
emplumados.
Ah, onde no mar
navegava meu barquinho,
que era o rei dos veleiros. Sobre ondas altas,
turbulências
imaginárias, escalar abismal de
desfiladeiros aquosos.
Terra à vista! Gritava
eu, em ecos, rebatidos pelos ventos, sob o
luar majestoso que se fazia de lâmpada para
os inquietantes sonhares: desvarios, quase
verdadeiros…
A criança diluiu-se em
nevoeiros. Ficou a
lembrança impregnante de pensamentos
burburinhos ensimesmados. O sonho
comum, da inocência
navegante, num barco
de papel a vela, levado por ventosos e
casuais redemoinhos.
Numa tempestade de
gritos infantis,
aventureiros, a desvencilhar
de rodopiantes
torvelinhos.
Terra à vista! Gritava
o infortúnio da
saudade. Pois, era quente, o grito, que
trovejava, tal qual raio na tempestade, com
olhares molhados, mesclados às gotas
espargidas. Com a
natureza, fusionava-se, à
liberdade. Com espada
de cavaco de pau,
forjado em fornalhas imaginárias. Com a
cabeça coberta de velhos jornais, folhas
encharcadas de
velharias noticiárias,
aventurava-se de vez a criança, despedindo-
se, viajante às causas
mais incendiárias.
Era gentil e senil, a
saudade, que na praia
mansa, de gestos
inquietos se vestiam. Do
verso borbulhante de calmaria de mar, do
barro de areia branca que os pés se cingiam.
Aportado das nuvens e águas sonhadoras,
dispersava-se de vez. Igual a voo desafiante
de passarinho, em bruma
volátil, a exalar-se
em fumaça, em asas de um pensativo talvez.
Da onda solitária que
lhe era atrelada, sumia-
se, em adeus, acima das
águas, em
esvoaçante nauta. Em intrépida, instigante,
sonhada, e alada poesia bordada.
Arte-Eliza Wheeler-Children's Illustrations
Com a saudade fez um passeio magnífico, cheio de encantamente para quem lê esse texto poético. Navegou com elegância e beleza, mesmo quando a criança se diluiu nesse mar. Abraço.
ResponderExcluirBeto!
ResponderExcluirSaudade de vc.
Que bom que publicou, vou
ler e voltarei para comentar
quanto ao texto tão belo.
Bjins
CatiahoAlc.
Rendilhado lindíssimo.
ResponderExcluirA saudade deu para bordar uma excelente prosa poética, muito ao seu jeito, inconfundível e magnífico.
ResponderExcluirGostei imenso, como é óbvio.
Continuação de boa semana, caro Beto.
Um abraço.
A saudade chega -nos, creio que a todos nós, sempre, porque é sinónimo de passado e esse tivemo-lo, mais ou menos alegre, mais ou menos sofrido, mais ou menos encantador na nossa meninice. O problema é que eu não sei retratá-lo assim, tão poético feito renda com fios de seda brilhante; como tu também eu imaginei barquinhos, casinhas e bonecas, todos eles construidos com muita imaginação, aproveitando elementos da natureza que abundavam pelo chão do meu quintal; e como era linda a folha recortada e dourada onde o bebé dormia aconchegado por uma outra folha feito cobertor macio ; e havia a casinha de pauzinhos construida onde não faltavam os animaizinhos de capoeira debicando o chão guardados por belas cercas cuidadosamente construidas. Pedrinhas, paus, folhas, ervas eram preciosidades nas nossas brincadeira de criança; não tinhamos os excessos de hoje, mas tinhamos a liberdade de corre pelos quintais, até que o sol se escondesse e assim retornavamos a nossa casa , modesta, mas onde reinava a alegria e a paz. Sei, Beto, que nem todas as crianças tiveram essa meninice e conheci muitas que, apesar da liberdade não tinham um pratinho de comida que lhes acalmasse a dor da fome; eram tempos muito dificeis onde a ditadura imperava e com ela a miséria, principalmente nas aldeias do nosso Portugal. Querido Amigo este teu texto é de uma ternura impressionante e foi com enorme ternura e muita saudade que voltei ao quintal da casa onde vivi até ir para o Brasil e que ainda está de pé, embora vazia de gente e de risadinhas infantis. Obrigada, Beto por me teres levado até ela através das tuas saudades aqui tão bem descritas. Beijinhos e saúde para todos
ResponderExcluirEmilia
Ahhhh, que bom voltar a ler você, que bom que voltou, querido Beto!! E continua com aquela elegância, heim? Falar de saudades, é uma lindeza, e desse seu modo é um presente!!
ResponderExcluirPublica mais, seu moço, não desapareça!!
Deixo meus votos de um lindo domingo, e uma criativa semana!
Beijinho, amigo!
Boa noite de paz, amigo Beto!
ResponderExcluirEstive fora uns dez dias para tratamento de saúde, eis a razão de me ter demorado em vir retribuir seu comentário.
"Saudade é minha sina, pois sou feito barro, modelado em tempos de laços."
Com o passar dos anos, temos muitos motivos para recordarmos.
Sua poesia bordada deu-me a oportunidade de viajar pelas asas literárias.
Sempre muito bom vir por aqui.
Tenha um feriado abençoado!
Abraços fraternos
Bordado a ouro este magnifico texto, em jeito de epopeia marítima... de um universo único, pessoal, e poeticamente transmissível!...
ResponderExcluirPara ler e reler, esta maravilha... Muitos parabéns, Beto!
Beijinho! Bom final de domingo e votos de uma excelente e inspirada semana!
Ana
Poema deslumbrante que me fascinou o ego, ler. Sem dúvida lindo de ler
ResponderExcluir.
Feliz fim de semana.
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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!Holaa, Beto¡
ResponderExcluirCuanta maravilla nos transmite tu lindísima Prosa poética y nostálgica, recordando cada paso que has dado por este caminar diario de la vida. cuanto más nos hacemos mayores, más volvemos la vista atrás. Recordamos cada rincón de nuestra tierra.
Es un gran placer pasar un roto leyéndote este divino texto poético y exquisito. Gracias por compartir tus bonitos sentimiento, Beto.
Te dejo mi fraterno abrazo, colmado de gratitud y bendiciones.
Se muy, muy feliz.
Um texto muito belo na sua singularidade. A palavra saudade é o fio condutor de tudo o que guardou no coração. Lembrei Ary dos Santos que tão bem definiu esse sentimento. Deixo um pouquinho:
ResponderExcluir"Esta palavra saudade
sabe a sumo de limão
tem o travo de amargura
que nasceu do coração".
Um abraço.