Cante,
sem dó, sabiá!
Cante para renovar!
Cante.
Revele o milagre
escondido
nas frestas do dia.
Cante
os faz de conta:
notas doces
de ninar.
Cante
o sol que desponta
por detrás das serras
da manhã.
Cante pelas montanhas
e nas matas
embebidas do cheiro
de hortelã.
Cante
no silêncio —
a tarde já se aproxima,
e a noite,
sem dó,
apagará tua luz.
Mas
cante!
Teu assobio potente
rasga o ar,
voa rente
entre os verdes matos.
Toque,
com leveza,
o piano dos bambus.
Cante, com teu gorjeio,
as notas vivas:
Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si...
Encante-nos
com teu fôlego de poesia,
às vezes
sem Dó de Si.
Cante!
Pois tuas lágrimas alegres
não conhecem fronteiras —
são feitas de melodias
no pé da laranjeira.
Cante
e me encante
com tuas plumas acesas,
ferrugem-laranja
no meu pé de limão.
Cante
sobre o gado,
esse agrado
que dos céus desce
em forma de canção.
Derrete-me
em sorrisos
com teu verso alado,
mais fundo que o rouxinol.
Brilha meu anoitecer
com teus cânticos,
e faz raiar
a vida inteira
com o sol da tua voz.